Lotes de esquina, quando comparados aos lotes de meio de quadra, geralmente possibilitam vistas mais expressivas e desimpedidas a partir do interior das residências para eles projetadas. Enquanto os lotes de meio de quadra possuem um lote vizinho de cada lado, um lote de esquina num dos seus lados possui um vizinho e no outro uma rua. Assim, além de potencialmente possibilitarem vistas mais ricas de dentro para fora, os lotes de esquina também potencialmente possibilitam que a própria expressividade de uma construção seja maior do que num lote de meio de quadra. Isso ocorre por possuírem mais superfícies externas livres das obstruções ou obstáculos visuais tais como aquelas que são criadas por uma casa num lote vizinho. Portanto, de dentro para fora e de fora para dentro, a priori, lotes de esquina oferecem mais ao projeto de uma casa.
O lote para o qual esta casa foi projetada situa-se no Condomínio Residencial Jardim Trípoli, Americana – SP. Ele, um lote de esquina, em termos daquilo que foi exposto sobre tais lotes, contradiz o comumente esperado pois não oferece as tais vistas mais generosas de dentro para fora da casa. Isso deve-se tanto ao desenho do parcelamento do condomínio como um todo, quanto à porção particular da topografia na qual o referido lote se insere. Assim, quando nos deparamos com o terreno deste projeto tivemos um grande desafio: proporcionar aos futuros moradores da residência a “paisagem” que naturalmente esperavam ter a partir de sua casa, mas que não poderiam tê-la devido à geografia do seu lote. Ele é de fato confinado pela topografia, pelo desenho das ruas e, numa consequência desses dois fatores, até mesmo pelos demais lotes e suas construções.
Conscientes desses desafios, nos empenhamos em superá-los criando uma paisagem dentro da própria casa, uma paisagem para ela mesma. Mas uma paisagem autêntica, única e que é fruto de um pensamento sobre a Arquitetura. Tal pensamento vem sendo construído, dentre outras consideráveis questões, a partir dos mais significativos discursos poéticos encontrados na arquitetura nacional e das relações que eles tecem com a tradição da arquitetura ocidental. Assim, no centro deste projeto, criamos um pátio interno com uma árvore e com um spa, e o coroando criamos uma balaustrada que sublinha a abertura para o céu e desenha sombras que vão marcando o tempo e transformando a arquitetura da residência.
O pátio que realiza uma paisagem exclusiva a esta residência dá continuidade às reflexões das pinturas em perspectiva (ou pinturas arquitetônicas) que outrora ampliaram e complementaram as possibilidades da arquitetura de algumas importantes igrejas. Assim, os discursos e as reflexões que precedem o discurso deste projeto podem ser encontrados, por exemplo, na nave da igreja de São Paulo, em Lisboa, ou na nave da Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto. Em muitas dessas pinturas, tem-se uma representação do Paraíso e cria-se, com a peculiar relação entre a técnica delas e a arquitetura na qual são empregadas, a sensação de que se está tendo uma verdadeira visão do Paraíso. Na pintura do teto da nave da Igreja de São Paulo, encontramos uma dessas típicas visões do Paraíso propiciadas pela relação entre tais pinturas e a arquitetura. Já no teto da nave Igreja de São Francisco de Assis encontramos uma rica variação dessas visões do Paraíso, que se apresenta associada ao arquétipo do Jardim do Éden. Nesta casa, o pátio foi criado com a intenção de que a paisagem por ele proporcionada remetesse ao arquétipo do Jardim do Éden e às tais visões do Paraíso.
A circulação vertical foi pensada como uma galeria para a exposição de pinturas. Suas aberturas são voltadas para o pátio com a árvore e com o spa do qual tiram o proveito da luz natural e fazem do deslocamento entre o primeiro e o segundo pavimento o percurso mais rico e agradável possível. Ainda explorando as possibilidades do terreno para a criação de uma paisagem própria, foi criado um eixo visual que atravessa toda a parte de uso comum da casa, desde o pátio com a árvore e com o spa, até outro pátio mais aberto, ladeado pela piscina, contendo uma área para uma fogueira no seu centro e uma fonte de água em um dos seus limites.
Sobre o potencial expressivo do exterior de uma casa num lote de esquina, tivemos ainda que lidar com o desafio do formato quase triangular do lote em questão. Tal formato não somente desafiou a disposição dos ambientes da casa, como também a criação das suas formas externas. Assim, a cor branca predominante foi definida para demarcar as formas anguladas que criamos e para imprimir melhor nas superfícies as sombras do sol e seus movimentos ao longo dos dias. Esta ideia de marcar o tempo nas próprias superfícies tem ocorrido cada vez mais nas nossas criações. E, atendendo ao pedido do cliente que gostaria de ver vidro na frente da sua casa, mas, ao mesmo tempo, evitando os problemas de conforto térmico e de privacidade que esse material poderia ali acarretar nos ambientes internos da mesma, criamos uma camada de “pele de vidro” que separa a garagem do átrio de entrada, e que sobe e percorre o segundo pavimento criando balcões para cada uma das três suítes.
